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Ruas para pessoas no Centro de Porto Alegre

1502690_595118370560539_1728167828_oA Mobicidade,  o escritório de arquitetura 0E1 e o TransLab estão propondo uma oficina de redesenho e humanização de três setores de ruas do centro histórico de Porto Alegre. As propostas serão entregues à Prefeitura Municipal ao término da oficina. Os encontros acontecerão nos três últimos finais de semana de janeiro. Às sextas feiras serão realizadas mesas-redondas abertas ao público com temas pertinentes ao projeto de cidade; ao longo dos sábados, serão desenvolvidas as propostas pelos grupos em ateliês. Áreas de intervenção: Quadras entre a Av. Otávio Rocha e a Rua dos Andradas: – Rua Doutor Flores – Rua Vigário José Inácio – Rua Marechal Floriano Peixoto

Inscrições para oficinas (arquitetos/estudantes de arquitetura) : 1E0@0E1.co (inscrições gratuitas)

 

 

A ponte de São Paulo que aumenta as distâncias.

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Artigo publicado originalmente no site Failed Architecture

Considerada por arquitetos um grande fracasso devido a uma série de razões – de sua feiúra patente à sua incapacidade de operar em escala urbana – A ponte Octavio Frias de Oliveira  conseguiu o que era , aparentemente, o seu principal objetivo: a tarefa de criar uma imagem de cidade global para São Paulo enquanto escondias as graves contradições e conflitos da cidade.

A ponte Octavio Frias de Oliveira – nomeada em homenagem ao empresário brasileiro responsável pela criação de um dos meios de comunicação mais influentes do Brasil , o conglomerado Grupo Folha – foi inaugurada em 10 de maio de 2008. A cerimônia, que contou principalmente por políticos e empresários de alto nível , foi acompanhada por uma pequena manifestação contra a proibição de pedestres e bicicletas na ponte.

Acesso à ponte: circulação de pedestres e bicicletas é proibida. Foto: André Pasqualini / CicloBR
Acesso à ponte: circulação de pedestres e bicicletas é proibida. Foto: André Pasqualini / CicloBR

A exclusividade dada ao transporte individual motorizado só não surpreende pela inexistência de ciclovias ou calçadas. Ao invés de ser uma ponte urbana – caracterizada pelo fluxo de pedestres, bicicletas e transporte público, juntamente carros em velocidade mais baixa -, esta ponte estaiada em particular foi concebida como uma obra de infra-estrutura em escala metropolitana, conectando vias expressas ao invés de bairros. Como resultado, a ponte é (mais) um elemento de infra-estrutura de São Paulo que fornece articulações em grande escala – e, neste caso, apenas para o transporte individual – enquanto dificulta a acessibilidade local.

Em uma cidade já congestionada pelo número excessivo de carros, e onde a distância média entre as pontes sobre  os principais rios da cidade é de cerca de 2 km, devemos realmente investir uma grande fatia do orçamento do governo – 113 milhões de dólares , na época – em um obra pública extravagante que nem sequer ligar os bairros nas margens opostas, nem permite que as pessoas a atravessem a pé, de bicicleta ou no transporte público?

Mapa das centralidades de São Paulo. Fonte: H. Frugoli Jr., EdUSP, 2006

Mapa das centralidades de São Paulo. Fonte: H. Frugoli Jr., EdUSP, 2006

 

Investigando o processo

A construção da ponte Octávio Frias de Oliveira foi parte de um processo mais amplo iniciado pela ” Operação Urbana ” Água Espraiada (um instrumento jurídico para política urbana), que pretendia criar uma nova centralidade terciária em São Paulo. Esta nova centralidade designada seria desenvolvida na planície do rio Pinheiros, que já foi um grande pântano com propriedades muito baratas (cujos preços, como resultado, cresceram exponencialmente nas últimas duas décadas).

“Operações Urbanas” permitem grandes transformações em uma área especifica por meio de associações com investidores privados. Nessas áreas, os regulamentos urbanísticos, como o índice de construção pode ser muito maior, mediante o pagamento de uma “contrapartida onerosa”.  A acumulação de contrapartidas gera recursos que devem ser investidos na mesma área, fornecendo infra-estrutura, habitação social, espaços públicos e outros itens que não são comumente oferecidos pelo mercado imobiliário.

Demolição da favela Jardim Edite. Foto: Revista Época.
Demolição da favela Jardim Edite. Foto: Revista Época.

No caso da ‘Operação Urbana’ Água Espraiada, a maioria dos recursos foram investidos em infra-estrutura rodoviária, minando a importância de fornecer habitação social para o grande número de moradores locais que tinham sido removidos. Um valor seis vezes maior foi gasto com a própria ponte do que com o complexo de 252 unidades habitacionais e equipamentos sociais públicos (creche, restaurante-escola e centro de saúde), que foi recentemente – e ainda parcialmente – inaugurado. Enquanto que todas as favelas da região foram demolidas, apenas 5% dos habitantes locais permaneceram na área, para dentro neste novo complexo. A grande maioria, no entanto, acabou expulsa e mudou-se para outras favelas na periferia da cidade, longe da vista das elites.

A ponte como um ícone ideológico

A ponte Octávio Frias de Oliveira funcionou como um projeto âncora na requalificação da Avenida Berrini, como uma nova centralidade em São Paulo. Junto de um complexo de edifícios corporativos ao longo do rio Pinheiros, ela criou o cenário perfeito para São Paulo ser vista como uma cidade global, com uma economia atraente, competitiva e proeminente.

Capa da revista Outlook São Paulo de 2013: um ícone de São Paulo como cidade global.
Capa da revista Outlook São Paulo de 2013: um ícone de São Paulo como cidade global.

A idéia de uma cidade global, transmitida por esta paisagem deslumbrante – idêntica a muitas outras por todo o mundo -, foi imposta como um consenso pelos principais agentes da cidade. Fascinados pela idéia de possivelmente viverem em uma ‘cidade alfa’ como Nova York, Londres ou Tóquio, a maioria da população de São Paulo legitimou esta despesa pública desproporcional. A ponte estaiada, como é mais conhecida, é agora celebrada pela maioria dos paulistas como principal cartão postal da cidade.

Há, no entanto , uma enorme diferença entre essa imagem de São Paulo como uma cidade global e a realidade que ela tenta esconder: a cidade com profundas contradições dentro de suas condições urbanas, onde as diferenças sociais podem ser radicalmente íngremes. O trabalho de construir esta ponte enquanto varre para fora da vista as favelas e seus moradores e despreza a mobilidade urbana e a conectividade revela até que ponto ainda é possível ampliar as distâncias físicas e sociais em São Paulo.

Giselle Mendonça estudou arquitetura e urbanismo na Universidade de São Paulo. Anteriormente, trabalhou no escritório de arquitetura MMBB e está atualmente trabalhando na SP- Urbanismo, empresa pública ao lado do Departamento de Desenvolvimento Urbano de São Paulo.

Marcela Ferreira também estudou arquitetura e urbanismo na Universidade de São Paulo e está atualmente trabalhando em projetos urbanos em Vigliecca & Associados, em São Paulo. Ela já colaborou anteriormente com OMA em Roterdãm e Nova York.